Um português

19.9.12
Poucos estarão lembrados, mas dizia-se em 2003 que iria ser gasto um milhão de euros na plantação de árvores nos terrenos adjacentes ao novo estádio de futebol em Braga.  O país contraía dívidas em betão, argamassa, elevadores, relva, balneários e cadeiras ao ritmo das paixões assolapadas. E mais do que o diz que diz, escreveu-se sobre o assunto e foram publicadas notícias nos jornais. Se a totalidade do dinheiro foi ecologicamente gasta, não poderá ter certeza absoluta desse facto o cidadão comum, mas também, diga-se, o real destino do dinheiro nunca foi grande preocupação nacional, local ou pessoal. E qualquer que tenha sido o real custo da empreitada, a verdade é que as árvores lá estão florestando a obra do arquitecto e rebentando já, passados nove anos, com o asfalto do parque de estacionamento junto ás bilheteiras.
Neste 18 de Setembro de 2012, às dez horas da manhã, seis jornalistas povoam o local, à espera da abertura da porta para um treino na véspera de um jogo da Liga dos Campeões entre o Braga e o Cluj. Houve uma conferência de imprensa a seguir ao treino e no meio das perguntas e das repostas veio à conversa o facto de haver um número elevado de jogadores portugueses nas duas equipas, por um lado devido à aposta certeira do Braga em talentos nacionais, e por outro devido ao facto de o campeonato romeno ser mais pobre do que o português e de ter por aqui encontrado um mercado de segunda e terceira escolha s à medida do bolso que tem. Português para cá, português para lá, o diálogo foi-se esgotando, a conferência de imprensa chegou ao fim, jogadores, treinadores e jornalistas foram embora, as portas fecharam-se, a pedreira (nome pelo qual o estádio também é conhecido) remeteu-se ao silêncio dos animais de grande porte, voltou a ficar obra de arte sem gente dentro.
No sopé desta história ficam as piscinas. O projecto existe e saiu do papel, levantou-se inclusivamente do chão. Não passou disso. É uma caixa cinzenta de betão armado, sem portas nem janelas, sem água nem piscina. Estava então a meia dúzia de jornalistas à espera do treino de futebol quando um português por ali passou, encostou o ombro esquerdo ao esqueleto da piscina e mijou contra o muro. Enquanto ele fez, fez-se um minuto de silêncio. Não morreu ninguém. Aliás, Portugal continua vivinho da Silva. Vai passando por nós de geração em geração.

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